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História-History
As pesquisas em Paleomagnetismo na América do Sul começaram em 1956/1957, quando o jovem pesquisador britânico Ken Creer coletou amostras orientadas de rochas, de derrames basálticos da Formação Serra Geral no Brasil e Uruguai e basaltos quaternários da Argentina. Ken era membro de um grupo interessado em Geomagnetismo, que havia sido reunido no início dos anos 1950, pelos pioneiros do Paleomagnetismo Prof. P.M.S.Blackett e Keith Runcorn. As direções de magnetização eram medidas com o magnetômetro astático que havia sido construído pelo Prof. Blackett.
As primeiras curvas de deriva polar foram traçadas por Ken Creer, usando rochas de várias idades e a questão importante então era se a deriva polar era real ou aparente, porque a segunda hipótese apoiaria as idéias de deriva continental. A dúvida poderia ser respondida comparando-se curvas de deriva polar obtidas para diferentes continentes. Havia interesse especial no ajuste dos continentes do Hemisfério Sul e então Ted Irving foi para a Austrália e Ken Creer veio para a América do Sul. Os primeiros resultados sul americanos de Ken foram publicados em 1958 nos Annales de Géophysique e resultados mais extensos apareceriam no The Geophysical Journal International, em 1962.
Ken Creer retornou à América do Sul várias vezes e, no início da década de 1960, tentou instalar um laboratório de Paleomagnetismo na Universidade do Paraná, em Curitiba, mas o estudante envolvido decidiu mudar de assunto e os instrumentos foram deixados lá. Na Universidade de Buenos Aires, ele encontrou então Daniel Valencio e uma longa história de amizade e colaboração começou. Valencio foi convidado a estagiar no laboratório de Creer em Newcastle-upon-Tyne, onde prepararam a instalação de um laboratório de Paleomagnetismo na Universidade de Buenos Aires.
Em meados da década de 1960, o Prof. P.M.S.Blackett, Prêmio Nobel de Física e então Presidente da Royal Society, fez uma conferência no então Departamento de Física da USP sobre “Continental Drift”, assunto sobre o qual tinha escrito um livro e, por essa época, alguns geólogos e físicos da Universidade sentiram a necessidade de desenvolver aqui pesquisas em Geofísica.
Em 1969, Umberto Cordani relatou a Igor Pacca a tentativa que Creer havia feito de instalar laboratório de Paleomagnetismo em Curitiba.Pacca tinha um Doutorado em Física dos Raios Cósmicos pela USP e, quando decidiu mudar para Geofísica, pensou em trabalhar num de seus campos fundamentais mas, a oportunidade de continuar aquela iniciativa, em assunto que estava tendo grande desenvolvimento, acabou prevalecendo. Após troca de correspondência, Creer visitou a USP e Cordani e Pacca decidiram ir a Curitiba e trazer, para o Instituto de Física da USP, os instrumentos que consistiam de um magnetômetro astático, partes de um desmagnetizador AF, bobinas de Helmholtz e uma perfuradora portátil.
Ken Creer e alguns geólogos brasileiros que conheciam Daniel Valencio, sugeriram que ele poderia ser convidado pelo Instituto de Física, para dar um curso de Geomagnetismo e ajudar na instalação do laboratório de Paleomagnetismo.
Daniel veio para São Paulo, onde permaneceu de abril a junho de 1971. Ajudou a definir os projetos de pesquisa, os trabalhos de campo e orientou a montagem dos primeiros instrumentos: o magnetômetro astático, o desmagnetizador AF e o magnetômetro fluxgate Foerster. O laboratório foi instalado numa sala no final de uma das alas do Edifício Basílio Jafet, do Instituto de Física.
Valêncio deu curso optativo para alunos de Física com o título de “Física do Magnetismo Terrestre”, que foi frequentado por vários alunos de Física, entre os quais Francisco Hiodo e Hideo Kinoshita, que vieram a ser bolsistas no laboratório.
Em 1972 Igor Pacca fez estágio no Laboratório de Paleomagnetismo da Universidade de Buenos Aires, onde trabalhou com rochas que havia coletado no Brasil e discutiu, com Daniel Valencio e Juan Francisco Vilas, os planos futuros para o laboratório de São Paulo. Ainda em 1972, foi publicado na revista Nature – Physical Science, um dos primeiros trabalhos de pesquisa do grupo.
Ao mesmo tempo, a Universidade de São Paulo passava por mudanças profundas em sua estrutura, resultantes da Reforma Universitária, implantada a partir de 1969/1970. As transformações atingiram o Instituto Astronômico e Geofísico, então Instituto Complementar da USP, dirigido pelo Prof. Abrahão de Moraes, e que inicialmente ficou fora da Reforma. Houve muitas discussões sobre o destino das Disciplinas existentes de Astronomia e Geofísica: iriam para o Instituto de Física ou para a Unidade que se chamou inicialmente de Instituto de Geociências e Astronomia. O Prof. Abrahão de Moraes insistia que a melhor solução seria a transformação do antigo IAG em uma nova Unidade de Ensino e Pesquisa que receberia estas disciplinas. Afortunadamente para o IAG, prevaleceu a proposta do Prof. Abrahão de Moraes que, infelizmente, veio a falecer em 11/12/1970, antes de se conhecer a decisão final.
Em 27/03/1972, Decreto Estadual transformou o antigo Instituto Astronômico e Geofísico em Unidade de Ensino e Pesquisa da USP e portaria de 26/05/1972 criou os Departamentos de Astronomia, de Geofísica e de Meteorologia. O primeiro Diretor da Unidade foi o Prof. Giorgio E. O Giacaglia, que teve como primeira tarefa organizar e povoar o IAG. A área de maior tradição no IAG era a Astronomia mas a criação dos Departamentos abria perspectivas de desenvolvimento também para a Geofísica e a Meteorologia.
Giorgio Giacaglia , pesquisador em Geodésia Espacial, convidou Igor Pacca a ir para o IAG, levando seu laboratório e licenciando-se do Instituto de Física, para, juntamente com ele próprio e mais os docentes do Instituto de Geociências Umberto Cordani e Koji Kawashita, em regime de tempo parcial, comporem o Departamento. Para atingir número mínimo de docentes e de categorias, faltava um docente, sendo convidado então o bolsista do grupo de paleomagnetismo Francisco Yukio Hiodo. Igor Pacca foi o primeiro chefe do Departamento de Geofísica, o que significava que parte do tempo que usaria para cuidar do nascente grupo de Paleomagnetismo, tinha que ser dedicada à implantação do Departamento.
Paleomagnetismo foi a primeira atividade de pesquisa do Departamento de Geofísica e, para instalar o laboratório e abrigar todas as outras atividades do Departamento, foi disponibilizado o edifício com a maior cúpola do IAG na Água Funda, chamado de Edifício da Grande Equatorial. O edifício nunca tinha tido um instrumento instalado era usado como depósito de materiais e estava em más condições, necessitando de reforma. No novo espaço e com a chegada de novos instrumentos, com auxílios da FINEP, FAPESP e CNPq, construção de instalações e equipamentos, o laboratório melhorou muito.Na Água Funda, completou-se a construção do desmagnetizador térmico e, em novembro de 1973, foi recebido o primeiro magnetômetro rotativo, o spinner Digico.
Novos estudantes de pós-graduação chegaram ao grupo. Entre os que ficaram mais tempo, além de Francisco Hiodo, estiveram Márcia Ernesto, Elisabete Pascholati, , Manoel D’Agrella, Benaia V. Alencar, Mario Salgueiro, Antonio José R. Nardy e Célia Montes. Desenvolveram-se vários projetos de pesquisa, abrangendo o estudo de diferentes litologias e idades geológicas.
Os derrames basálticos da Serra Geral, que haviam interessado a Ken Creer, continuavam nas prioridades do grupo e, em 1975 foram apresentados, em Conferência Internacional sobre Margens Continentais, resultados de um primeiro estudo paleomagnético sistemático de secções da Serra Geral no Sul do Brasil.
O trabalho publicado em 1976, acabou dando origem a extensos projetos de pesquisa, colaborações internacionais e várias teses e dissertações. Em 1978, ocorre a defesa do primeiro Mestrado no grupo, por Márcia Ernesto. O Departamento, o Laboratório e o Grupo atingem estado de consolidação que possibilitou maior desenvolvimento nas décadas seguintes.